Seminovos e usados

EM TENTATIVA

Pessoal

Mora no Rio de Janeiro. Carioca adotivo, faz umas coisas por aí e já quis escrever com alguma disciplina, razão de ser desse blogue.

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No cabeçalho do blogue são três britânicos vasculhando os destroços da biblioteca de Holland House, em Londres, outubro de 1940, após bombardeio alemão. Nove em cada nove espíritos elevados concordam que entre uma bomba e outra há sempre espaço para uma flûte de champagne, um passeio de olhos em prateleiras repletas de livros e uma boa leitura. Sem dúvida.

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quinta-feira, setembro 08, 2005

BALÉ

- Sabe uma coisa que eu não consigo entender? Por que resolver dançar balé agora, já adulto? Cara, você trabalha, tem mulher, já é pai. É esquisito pacas isso, você há de convir.

- Mas não é nada complicado, chega a ser óbvio até. Como você bem disse, eu hoje estou casado. Lembra da vovó dizendo que as mulheres se casavam para sair de casa, poder estudar, trabalhar, trepar, etc? Quando um homem decide fazer balé, ele é sempre acusado ou de ser viado, ou então de querer comer as meninas com quem ele vai dançar. Estar casado me livra a cara dessas duas acusações.

- É só isso? Quer dizer então que você sempre quis fazer balé, mas a opinião dos outros a seu respeito te impedia? E depois que você se casou você se viu liberado? É isso?

- Não é só isso. Estar casado acaba redirecionando boa parte das suas energias. O que você antes consumia com farras, festas e congêneres, vira excedente, uma sobra de força e tempo que é preciso aproveitar de alguma forma.

- Putz! Então foi falta do que fazer? Energia demais não aproveitada?

- Não apenas, não apenas. Quando se cresce e a vida adulta se impõe, tudo se torna pesado. Sua mulher reclama de tudo o tempo todo, o bebê não pára de chorar, o trabalho se acumula, o dinheiro não dá para pagar as contas. O prazer some. Tudo é cada vez mais sofrido e pesado. A tal maturidade, como gostam de chamar.

- E dançar balé e uma forma de amenizar isso? Mexer o corpo, se expressar artisticamente. É isso, então?

- Pelo contrário. O balé é vexame e dor. Você faz papel de palhaço desde o momento em que calça as sapatilhas e veste aquela calça de malha e o collant, até o final das aulas, já que você obviamente não tem mais a força e a flexibilidade necessárias para acompanhá-las. É bom para te deixar morrendo de saudades do condicionamento físico que você teve e deixou para trás em algum lugar de sua infância. Desde o primeiro dia suas costas parecem ter sido esmagadas por um trator. Os tendões do tornozelo imploram pelo amor de deus que você pare já aquela sandice de exigir que eles se dobrem mais do que a natureza permite. Os joelhos inflamam e a dor te leva a perder as forças. Dói tanto que você é obrigado a se sentar, ou até mesmo deitar, esperando que ela passe. Quando não passa, o jeito é tomar um grande coquetel de antiinflamatórios. Isso se quiser continuar fazendo coisas simples, como caminhar, por exemplo.

- Caralho! Se não existe arte, se não te faz bem nenhum, só te detona mais do que você já reclama estar detonado, por que fazer essa droga de aula de balé?

- Por isso mesmo, cara. Por isso mesmo. Passa o saco de gelo, agora, sim? Ah! E alcança o controle remoto. Adoro esse seriado.