Seminovos e usados

EM TENTATIVA

Pessoal

Mora no Rio de Janeiro. Carioca adotivo, faz umas coisas por aí e já quis escrever com alguma disciplina, razão de ser desse blogue.

A Foto

No cabeçalho do blogue são três britânicos vasculhando os destroços da biblioteca de Holland House, em Londres, outubro de 1940, após bombardeio alemão. Nove em cada nove espíritos elevados concordam que entre uma bomba e outra há sempre espaço para uma flûte de champagne, um passeio de olhos em prateleiras repletas de livros e uma boa leitura. Sem dúvida.

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segunda-feira, dezembro 20, 2004

RAIVA

- Lembra quando éramos crianças e nos jogos de futebol você gritava em campo comigo pelo puro prazer de me fazer chorar?
- Isso foi há muito tempo...
- Eu sei quanto tempo faz! Eu sempre sei quanto tempo faz! Sou eu quem está falando aqui, entendeu?
- Entendi.
- E das aulas no liceu, você se lembra? Eu passava sozinho o recreio, sem amigos. Tudo o que eu queria era comer meu lanche em paz e retornar para a sala de aula para que e a manhã terminasse bem. Mas dia sim, dia não, você e seus amigos faziam troça de mim, roubavam meu lanche e me obrigavam a engraxar seus sapatos. Eu também não esqueci disso.
- Eu era muito novo...
- Quieto! Quando você começou a namorar, fazia questão de me usar para impressionar as garotas que queria conquistar, me obrigando a servir de escravo para elas. Eu só fui ter coragem de convidar uma menina para sair comigo quando já tinha vindo estudar na capital.
- Eu já pedi desculpas por tudo isso e...
- Eu ainda estou falando! Eu posso falar a manhã toda, na verdade. Posso desfiar um rol de misérias com as quais você polvilhou minha vida. Mas não vou perder meu tempo aqui lembrando das suas canalhices, como aquela vez em que currou minha namorada, ou quando pediu emprestado o dinheiro da poupança para a faculdade do Pedrinho e nunca pagou, nem mesmo a vez em que usou meus documentos para dar aquele golpe na praça e eu acabei preso em seu lugar, cumprindo pena de um ano e três meses.
- Eu não tenho sido um bom irmão, eu sei...
- Já falei para ficar quieto! Não entende o que é ficar quieto? Ficou burro depois de velho? O que eu vim mesmo dizer para você é que não passa um dia sem que eu pense que você merece estar paraplégico, entrevado nessa cadeira, broxa, aqui nesse asilo de quinta categoria. Às vezes eu acho até que é pouco. Pouco! Ouviu? Muito Pouco! Por isso é que eu vim aqui hoje. Para dizer tudo isso. E tem mais...
- Pode dizer. O que quiser.
- Que essa porcaria de baralho é meu e só pega o morto quem tiver canastra limpa! Entendeu? Canastra limpa! Agora corta! Mas com a mão direita. A mão direita!


quinta-feira, dezembro 16, 2004

ENQUANTO ISSO, NA SALA DE JUSTIÇA...

- Vamos acabar com o medo e a pieguice!
- Êêê! Viva!
- E vamos acabar com as empadas sem azeitona!
- Êêê! Viva!
- E também com o bicho de pé!
- Êêê! Viv... Com o bicho de pé também?
- Também.
- Ah! Não... É tão gostoso...

***

- Levante as mãos quem acredita em livros!
- ...
- E levante as mãos quem acredita em latas de goiabada!
- ...
- Você! Aleijado, sem braços, cético de uma figa... Fora daqui! Agora!

***

- Depressa! Precisamos fazer alguma coisa! A máquina de café quebrou e um fragmento de meteorito precipitou-se no oceano Pacífico, formando uma enorme tsunami que ameaça destruir todo o continente!
- Como é? A máquina de café quebrou?



terça-feira, dezembro 14, 2004

LANÇAMENTO

A essa altura do campeonato todos já devem estar sabendo, mas não custa lembrar o convite, para o lançamento do livro Paralelos, feito nos blogues O Caderno Branco de Mora Mey e inveja de gato, que aparecem aí ao lado, no Leio do Seminovos.

Vou estar lá, com certeza, no primeiro dia. Quinta e sexta já não garanto. El Thiagón já disse que vem de Petrópolis, e será um prazer conhecer pessoalmente todos os que acompanham essas maltraçadas linhas e que se aventurarem a comparecer.

Segue a programação, cujo texto integral está no epiderme:

"Dia 15 - quarta - Lançamento do livro Paralelos - Editora Agir - a partir das 20 horas 18 autores autografam em mesas de escritório personalizadas ao longo da calçada entre a rua Fernando Azevedo e a Dantes Livraria. Rola uma espécie de cortesia no chope Devassa.

Dia 16- quinta - Programação Paralela - Conversa de botequim e leitura com os escritores paralelos: Antonia Pellegrino, Augusto Sales, Crib Tanaka, Francisco Slade, Mariel Reis, Pedro Sussekind, Paloma Vidal e Simone Paterman e outros. O ateliê culinário estará vendendo um PF de botequim por R$ 10,00

Dia 17 - sexta - FESTA NA RUA - Programação Paralela - (a Rua Dias Ferreira estará fechada): som com DJs Paralelos + Projeto « Na Tábua » com o escritor e agitador cultural gaúcho Paulo Scott (Ainda Orangotangos, Livros do Mal). Elenco Djs: Cecília Giannetti, JP Cuenca, Gustones, Salgueirinho, Jaime, Flávio e Sales. Convidados especiais: Paulo Scott, Paulo Roberto Pires e outros.
"

sábado, dezembro 11, 2004

CORES

Certas cenas têm cor própria, que qualquer par de olhos, ainda que destreinado, consegue distinguir.

É amarelo o trânsito de corpos nas áreas de lazer espalhadas pela cidade em busca de uma sobrevida num corpo saudável, assim como é branco os lábios entreabertos dos fiéis ao receberem a eucaristia das mãos do sacerdote. E quando os carros são forçados a parar num engarrafamento qualquer, é verde a cor que toma conta dos motoristas embaçando-lhes a vista.

Pedro observando Mariana na cozinha de azulejos azuis e piso de fórmica branca era vermelho. Vermelho da paixão de Pedro desconcertado, olhos fixos nos detalhes de Mariana. Os contornos de seu corpo e as nuances de sua personalidade revelam para ele uma mulher indecifrável, o que o faz mais e mais refém daquele amor. Para seu desespero, ela jamais haveria de precisar dele, depender dele, com a mesma intensidade da recíproca.

A independência pulsante de Mariana é uma mancha bege no rubor que aflora em Pedro. Corrói-lhe a falta que sente do escarlate puro, sem máculas, e ele passa a enxergar apenas a pureza que já houve em seu olhar sobre a mulher. O amor em Pedro é querer de volta o vermelho vivo de antes, fazer sumir o bege.

Os passos na direção dela são inevitáveis. É preciso aproximar-se e a todo custo apagar as manchas. Purificar Mariana. Tão bonita a mulher, de movimentos leves e ritmados, em cujas mãos a lâmina da faca de cozinha tem a desenvoltura de uma bailarina. Pedro colado ao corpo de Mariana. Os olhos dela tomados por lágrimas. Sumiram as manchas. Só Mariana. Apenas Pedro.

- Bem perto assim de mim, você fica linda cortando cebolas.



terça-feira, dezembro 07, 2004

DOIS POEMAS PARA COMPENSAR A AUSÊNCIA

DEUS

Deus viria
num peixe cru,
no peito nu,
na geléia
do pão com centeio.

Deus viria
tanto
que você veio.



PASSOS

Leblon,
meu loiro
vento
à orelha.

La rouge
Gávea,
menina
ruiva.

Alma janela,

aquarela
de cru amor.